A realização de experimentos em sala estimula o interesse pela ciência e favorece a compreensão dos temas tratados em aula
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No imaginário das crianças e da imensa parte dos adultos, mora um estereótipo de cientista clássico: de cabelos meio desajeitados, óculos, jaleco e rodeado de vidrarias, microscópios e equipamentos em seu laboratório. Além disso, é bem possível que seja um homem e branco. Esse “cientista imaginário” é construído lentamente ao longo dos contatos que temos com a Ciência, seja na escola, na mídia, nos filmes, nos livros etc.
Ao longo da história, sabe-se que a pesquisa científica foi majoritariamente atribuída aos homens, e que as grandes cientistas mulheres foram colocadas à margem das publicações e dos louros dos avanços na área. Além disso, o perfil para ciência sempre foi vinculado às elites que podiam pagar pela cara e restrita formação acadêmica.
O experimento na Ciência é um recurso necessário para a verificação das hipóteses elaboradas pelos cientistas, quando essas são possíveis de serem testadas. Os resultados de um experimento científico podem ser muito diversos, negando, confirmando ou modificando a hipótese inicial. Para que a sua confiabilidade seja a mais alta possível, é comum que alguns procedimentos façam parte dos experimentos, a fim de controlar o máximo de variáveis.
Um exemplo deles é a manutenção de um grupo-controle. Por exemplo, se quisermos saber se a quantidade de certo nutriente favorece o crescimento de uma planta, será preciso fazer um experimento modificando a quantidade do nutriente normalmente disponibilizada para ela, mas também é indispensável manter outra planta com a quantidade tida como normal deste mesmo nutriente.
Somente modificando essa única variável entre experimento e controle, mantendo ao máximo todas as outras – temperatura, umidade, luminosidade, espaço etc. – poderemos fazer afirmações mais seguras caso os resultados desse experimento se mostrem divergentes. Podemos citar outros procedimentos importantes que aumentam a confiabilidade dos experimentos nas Ciências da Natureza, como a randomização (escolha aleatória de participantes) e o método duplo-cego (em que nem os cientistas e nem os participantes sabem se fazem parte do grupo-experimental ou do grupo-controle).
O papel da ciência na escola
Contudo, quando falamos de experimentação na escola, é importante distinguir a finalidade do experimento científico entre os pares do seu papel como recurso didático e educacional. Comumente, os experimentos na escola, as chamadas “experiências”, são utilizados como estratégias para validar a explicação teórica do professor, para demonstrar e certificar fenômenos naturais.
Também se acredita que, fazendo experimentos, os alunos “descobrem coisas” e “fazem ciência”, mas não é bem isso que a literatura em ensino e aprendizagem de Ciências na escola vem nos mostrando nas últimas décadas. Para que uma experimentação seja também uma boa situação de aprendizagem, é importante que os alunos atuem de forma mais ativa nessa atividade, de modo que possam ir além de observar e registrar o que viram. Por isso, para ampliar o potencial educativo dos experimentos na escola, é indispensável que as alunas e os alunos:
- planejem experimentos para testar as suas hipóteses, estabeleçam as variáveis envolvidas e escolham intencionalmente quais delas farão parte da experimentação e não serão alteradas no grupo-controle. Para isso, é indispensável propor boas “perguntas abertas”, que não tenham soluções únicas e limitadas.
- discutam coletivamente (com outros alunos e com a mediação do professor) o que é possível observar, e o que é permitido manipular para imaginar cenários e fazer inferências sobre resultados possíveis.
- analisem e comparem resultados a partir dos próprios critérios que escolheram, para que compreendam e concluam que dados negativos e/ou a ausência deles em um experimento também consistem em um resultado.
Obviamente, esses encaminhamentos devem fazer parte de um planejamento maior do professor. Se o experimento deve ser uma ferramenta para pensar sobre os fenômenos e sobre como se faz Ciência, os docentes precisam autorizar que os alunos tenham um papel ativo nessas atividades. Para isso, aqui vão algumas condições importantes:
- proponha experimentos de forma intencional e planejada. Se você deseja problematizar um fenômeno, por exemplo, é possível começar uma sequência de aulas – sem antecipar o tema para eles – com um experimento que vai trazer mais perguntas do que respostas. Solicitar que os alunos expliquem por que se formam gotículas de água por fora de um copo com água gelada, ou porque uma bexiga cheia de ar diminui de tamanho quando colocada no freezer, por exemplo.
- não ofereça respostas prontas às perguntas levantadas pelos alunos nos experimentos (não nessa etapa). Ajude-os a sistematizar as dúvidas, anotando-as e estabelecendo passos para respondê-las. Devolver boas perguntas para eles ajuda nesse encaminhamento, como por exemplo: o que você observou e que lhe fez pensar dessa forma? O que faria que o seu resultado fosse diferente? O que você precisa entender melhor? Como fazer para avançar nessa tarefa? Essas perguntas são metacognitivas e ensinam para além dos conceitos científicos que estão em jogo no experimento: permitem também que os alunos aprendam como resolver problemas da área.
- após o experimento, discuta os resultados com todos os alunos, solicite que eles organizem os dados utilizando recursos como quadros, tabelas, gráficos e esquemas, apresentando-os para toda a turma. À medida que as socializações forem ocorrendo, ajude-os a sistematizar o que já sabem daquilo que ainda precisam investigar. Nesse momento, é possível que a aula expositiva do professor já seja necessária para oferecer boa parte das respostas que os alunos não conseguirão alcançar sozinhos, mas ela atenderá a perguntas que os alunos já se fazem e, portanto, têm condições de serem muito mais significativas.
- apresente conhecimentos históricos da ciência construídos a partir de dados controversos, de conflitos de interesses, por erros metodológicos. Isso permite que os alunos compreendam o funcionamento da ciência, a sua condição de reprodutibilidade e falseabilidade. É o método e o rigor que permitem que ela seja o instrumento mais seguro que temos para construir conhecimento.
Ciência para todos
Aqui cabe retornar a algo importante já citado no início do texto: a compreensão que temos da Ciência se constrói a partir das experiências que temos com ela, inclusive na escola. Estudos apontam que as brincadeiras na infância, por exemplo, acentuam a desproporção entre homens e mulheres na ciência. Meninos costumam ser mais encorajados a experimentar, desmontar, investigar, enquanto as meninas são mais estimuladas ao cuidado e à humanização.
Isso impacta o cenário de escolhas para as carreiras e reflete a maior quantidade de engenheiros, médicos e arquitetos homens e de pedagogas e enfermeiras mulheres, por exemplo. Os experimentos na escola também possuem, portanto, uma importância significativa para a democratização da Educação em Ciência. Não propriamente a sua mera proposição, mas também a sua forma de encaminhamento.
Experimentos na escola não devem se limitar a motivar os alunos, a serem atividades lúdicas ou simples demonstrações. Deve ser um recurso para favorecer o entendimento dos fenômenos naturais, mas, principalmente, para compreender a natureza e o funcionamento da ciência.
Fabrício Cruz
Mestre em Ensino e História das Ciências e Matemática e Especialista em Ciência e Tecnologia pela Universidade Federal do ABC – UFABC. Biólogo, Professor de Ensino Médio, Coordenador Pedagógico, membro do Grupo de Pesquisa em Ensino de Ciências e suas Complexidades, da Universidade Federal do ABC.
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